Projeto Infiltrado (Desde abril de 2007)

Será que um Projeto considerado perfeito, acima da Lei e corrupto, já não conta com infiltrações em seu âmago? Ou há um plano de comentar bastidores e posições dos que arquitetam essas manobras, sem filtros e de forma crítica? Pode ser que haja um esquema pronto para infiltrar nesses sindicatos negros e trazer a público o que muitos não sabem por acontecer nesses bastidores. Ao descobrir o significado do Projeto Infiltrado, você pode colaborar para sua própria execução.


segunda-feira, 21 de maio de 2007

Viagem ao centro da Terra

Foto: Frederico Haikal







A primeira, a gente nuca esquece. Tinha uma proposta de pauta lá na redação. Quem fez foi a pauteira, a Ana Arsênio. O repórter deveria contar como eram os subterrâneos de Belo Horizonte. Foi oferecida a uma repórter mais experiente que recusou solenemente. Quando ofertada a mim, que à época só fazia matérias do dia e olhe lá, soube logo que era a chance dourada de fazer o que gosto.

E queria descer em mais de uma galeria. Tinha de sentir de perto como eram e como quem trabalhava nelas fazia. Na primeira que entrei, ( foto acima) sob a Rua Professor Morais, quase vomitei. O cheiro azedo e forte ardeu minhas ventas e embrulhou meu estômago na hora. Tive de colocar o nariz dentro da roupa plástica para o cheiro da borracha e do plástico aliviarem o odor.

Numa outra, que parecia ser uma moleza, já que a sua entrada era apenas um tampãozinho, quase que a matéria não saiu. Os engenheiros da Sudecap abriram o tampão e o repórter fotográfico, Frederico Haikal, e eu, olhamos embasbacados para baixo. Para chegar na galeria, precisávamos descer uma escada de 12 metros, que começava 1 metro abaixo do solo. Uma alavanca ficaria atravessada na circunferência da abertura, no passeio acima, para que pudéssemos segurar nela com a mão, já que não havia apoio.

Lembro como se fosse hoje. O Fred me olhando com cara de “sei não heim cara”. Poxa, não podia perder essa história. Seria minha primeira grande reportagem no jornal. E agora? Mesmo tendo feito inúmeras escaladas antes, aquela situação era realmente perigosa. Perguntei para os dois engenheiros se não tinha corda nem nada para a gente descer rapelando. Disseram que não, que era fácil e tal e coisa. Em meio à nossa hesitação, um tenente do Corpo de Bombeiros que estava num ponto de ônibus próximo foi até lá e recomendou a gente não descer, porque avaliou, numa inspeção relâmpago, que não havia segurança para a descida.

O Fred e eu já estávamos inclinados a desistir, quando o Reuter, que era o chefe da equipe da Sudecap virou para o bombeiro e começou a falar suas credenciais, que tinha mais de 20 anos disso e 15 daquilo. O Fred virou para mim e me entregou a mochila com as lentes e filmes. “Toma aqui. Isso agora é sua responsabilidade, porque estou com a câmera”, disse, e logo desceu atrás do Reuter. Acho que ele pensou que eu ia ficar de fora... Ledo engano. Desci logo atrás e, com um certo esforço, menor do que aparentava do alto, vimos a mais bela galeria de BH, construída de tijolos em forma de abóbada.

A foto do Fred também foi show. Coisa de artista mesmo. Como tudo era escuro, ele abriu o diafragma da máquina todo e usou duas lanternas para “pintar” com a luz as paredes escuras. A foto ficou violenta. Se o jornal liberar ponho aqui. Se não, ta no www.hojeemdia.com.br, do dia 24/07/2005. A Adriana Diniz também me ajudou muito. Troquei muitas idéias com ela , que, enquanto editava a matéria, me dava uns toques de fontes e idéias legais para aproveitar.

Viagem ao centro da Terra

Mateus Parreiras

Repórter

Energia, água, esgoto, informação. Debaixo do asfalto das ruas e passeios que permeiam a cidade, complexas redes subterrâneas permitem que o belo-horizontino viva na superfície com mais conforto, e tenha acesso a recursos indispensáveis em seu cotidiano, mesmo que poucos tenham consciência da extensão de toda essa estrutura. Para desvendar essa malha de túneis e galerias, o HOJE EM DIA percorreu as principais redes de água e esgoto, e galerias fluviais e pluviais da cidade, algumas modernas, outras desativadas, erguidas na época da construção da cidade.

Nesse subsolo extenso, há 5.194 quilômetros de tubulações adutoras de água, distância maior que a que separa os dois extremos do país, o Oiapoque e o Chuí (5.018 quilômetros), e que abastecem 832.819 consumidores. As redes de esgoto sanitário somam 3.727 quilômetros - 224 quilômetros a menos que a distância rodoviária entre BH e Manaus. Elas chegam a 785.352 imóveis, e atendem a 93% da população. Ainda existem 390 quilômetros de cabos de eletricidade; 1.200 quilômetros de cabos de fibra ótica; e 160 quilômetros de canais fluviais fechados.

Um mundo sombrio e úmido, que a maioria da população, envolvida na correria do dia-a-dia, desconhece. Enquanto motoristas e pedestres circulam pelas ruas e passeios da cidade, na escuridão do subsolo, engenheiros, operários e técnicos trabalham no monitoramento, manutenção e ampliação dessas redes. Sob a Praça 7, por exemplo, no coração da cidade, por onde circulam 2 milhões de pessoas por dia, segundo estimativa da Polícia Militar, há um mundo intrincado de cabos de fibra ótica da Telemar, que permitem ligações telefônicas dos escritórios, empresas, e domicílios, além do tráfego de informações pela Internet.

Grossos cabos de alta-tensão enterrados a cerca de um metro do pavimento levam eletricidade para os edifícios, movimentando elevadores e outras máquinas, iluminando repartições, e fazendo funcionar os sinas de trânsito. Igualmente complexas são as tubulações de água e esgoto da Copasa, sujeitas a constantes manutenções devido ao grande consumo, e também ao elevado nível de dejetos lançados na rede central.

Outro complexo subterrâneo fundamental para o funcionamento da cidade são as galerias pluviais e fluviais. Elas impedem que as águas da chuva façam com que os mil córregos que cortam Belo Horizonte transbordem, levando caos ao trânsito e desespero a famílias e trabalhadores, como acontecia até a década de 70, antes das obras de canalização dos ribeirões Arrudas e Onça.

Os subterrâneos também são cercados de mistérios e histórias, muitas delas contadas pelos homens responsáveis por sua manutenção. Eles enfrentam a escuridão e confinamento dos túneis, o perigo dos gases venenosos, o risco de doenças transmitidas pela água ou pelos ratos que povoam os dutos, e a irresponsabilidade daqueles que jogam lixo e até eletrodomésticos dentro dos cursos d'água, objetos que acabam nas galerias do subsolo.

Onde o homem é apenas um visitante

Os acessos aos subterrâneos de Belo Horizonte são discretos. Geralmente tampões de ferro idênticos aos que guardam registros e padrões de energia sob os passeios. Quando são abertos, e a luz penetra sua escuridão, se tornam janelas para um mundo misterioso, às vezes até 20 metros abaixo do solo. Interior revestido de concreto ou mesmo de tijolos, ambientes apertados e inóspitos, muito úmidos, quentes, abafados, e completamente escuros, seus habitantes naturais poderiam muito bem fazer parte de um filme de terror. São baratas, ratazanas, aranhas e escorpiões, em meio a fungos, líquens e musgos. O homem é apenas um visitante.

E é nas breves visitas dos profissionais de manutenção que se explora melhor os dutos e galerias do subsolo. Debaixo da Rua Professor Morais, no Bairro Funcionários, uma galeria recém-reformada canaliza o Córrego do Leitão. Para manutenção preventiva, técnicos da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) retiram as grelhas de ferro, que pesam meia tonelada, com um caminhão muque dotado de braço mecânico hidráulico com um gancho. Os responsáveis são o chefe da Divisão de Manutenção de Vias Públicas, Reuter Ferreira Júnior, e o coordenador do grupo diretor de Planejamento e Drenagem, Adelino Gomes da Silva.

Agentes da BHTrans precisam conter o trânsito. Com uma corda, a dupla da Sudecap desce um pequeno medidor eletrônico de gás, que detecta presença de dez tipos de gases tóxicos, mortais caso inalados, para conferir se podem entrar. Sob os olhares curiosos dos motoristas, os especialistas descem por uma escada de bombeiro com o medidor de gás afixado ao peito. O ambiente é sombrio e claustrofóbico. Além das luzes das lanternas e da abertura por onde se acessa a galeria, a única iluminação vem das demais grelhas, que seguem a cada 50 metros. O tráfego intenso dos veículos bloqueia constantemente essa luz. O choque dos pneus contra as grelhas, quase imperceptível para os motoristas, ecoa no subsolo, lembrando o som de uma locomotiva, prestes a romper pela imensidão do túnel.

Um cheiro forte de esgoto empesteia a galeria, causando náuseas a narizes desacostumados. “Nas primeiras vezes, o cheiro incomoda bastante. Mas, com o tempo, a gente se acostuma", conta Adelino Gomes. Todas as tubulações de esgoto doméstico que chegam às galerias são clandestinas. O duto subterrâneo tem três metros de altura por quatro de largura. As paredes cinzentas, de concreto armado, ficam encobertas por pó de asfalto, poeira e teias de aranha. Sobre o piso corre um pequeno curso d'água, de um metro de largura, mas que pode ganhar volume rapidamente no tempo chuvoso.

Os vistoriadores começam os trabalhos verificando primeiro, visualmente, o estado da galeria. Suas lanternas percorrem as paredes em busca de possíveis rachaduras e da ferrugem nas armações. Depois, com uma vara de dois metros, cutucam o concreto das paredes e sob o córrego para conferir sua consistência.

Mais antiga

Cerca de dez metros abaixo da Avenida Brasil, no quarteirão entre a Avenida Afonso Pena e Rua Pernambuco, uma das mais antigas galerias da cidade - de 1897, época da construção da capital -, resiste, mesmo depois de desativada. O Córrego da Serra ainda corre dentro de tubos que cruzam seu piso. Paredes abobadadas, construídas com tijolos de barro, o túnel centenário chegou a ter 3,5 metros de altura, que hoje não passa de 1,5 metro devido ao assoreamento. A galeria lembra os históricos esgotos londrinos e parisienses, habitada por baratas, reveladas pelas luzes das lanternas. “São construções antigas, de uma engenharia de materiais de época. No Parque Municipal também há uma assim, de águas límpidas e com lambaris", conta Adelino Gomes.

Trabalhadores enfrentam risco de contaminação

Quando alguém se depara com cones cercando uma grelha ou bueiro aberto na rua, dificilmente imagina que homens treinados podem estar a dezenas de metros solo abaixo, garantindo o funcionamento das redes e galerias subterrâneas da cidade. Muitas vezes, os profissionais têm de se esgueirar por passagens apertadas, onde enfrentam ratos, baratas, escorpiões, e, ainda, risco de contaminação por microorganismos que proliferam no esgoto. Esses trabalhadores recebem adicionais que variam de 10% a 40% dos vencimentos, devido às condições insalubres a que são expostos no exercício das suas funções.

Mesmo quando o esgoto é desviado, e o túnel seca, os operários da Copasa e da Sudecap, por exemplo, correm riscos ao trabalhar tão próximos aos resíduos acumulados entre ferragens enferrujadas, arames, plásticos e uma infinidade de dejetos presos pelo curso dos dutos. Apertados em um espaço revestido por concreto armado, de 1,60 metro por 1,80 metro, os trabalhadores que recuperam o Canal da Rua Palmira, onde o Córrego Bolina flui, na Serra, precisam se espremer para manobrar britadeiras, picaretas, pás e carros-de-mão.

Por segurança, vestem macacão sanitário com bota emborrachada e luvas acopladas, máscara com filtro duplo para gases e partículas suspensas, protetor auricular, capacete com jugular, óculos de segurança, e usam lanternas, cordas, cinto pára-quedista, detector de gases, escadas, placas e cones.

Como acontece em diversas galerias, a manutenção no canal foi necessária por causa de danos provocados pelo esgoto clandestino. Com o tempo, os rejeitos orgânicos e químicos liberam gases como o ácido sulfídrico, que corrói o aço das armações e destrói o concreto, chegando a 'escavar' grandes buracos.

O superintendente da Sudecap, Paulo Takahashi, informa que são gastos R$ 15 milhões anualmente para manutenção das redes. “Se não houver manutenção, as paredes podem ceder aos poucos, assorear os cursos e até ocasionar desabamentos, que podem comprometer as vias acima ou colaborar para a retenção da água, causando enchentes", disse.

Tubulações de água e esgoto são as mais extensas

Mais extensas do que as galerias fluviais e pluviais, mas menos amplas - poucas comportam um técnico em manutenção no seu interior -, as tubulações de água e de esgoto da Copasa também precisam de constantes vistorias. Os acessos para as redes de distribuição de água tratada ficam em 4.649 pequenos cômodos subterrâneos, logo abaixo das ruas, as chamadas caixas de manobra. As redes alimentadoras ficam instaladas em pequenos compartimentos abaixo dos bueiros dos passeios.

Os esgotos são mais simples. Correm pela gravidade, sendo visíveis, da superfície, por meio dos postos luminares, protegidos por tampões nos passeios, ou dos 71.216 postos de visita, abaixo das pistas. Nesse caso, os trabalhadores não descem. Usam sondas para pequenos reparos. Consertos na rede demandam abertura de canteiros de obras, retroescavadeiras e operários.

A falta de acesso de vistoriadores aos dutos dos esgotos facilita a proliferação das ratazanas, que migram do sistema para as galerias pluviais. Até junho último, a prefeitura recebeu 26 mil chamados para controle de ratos. A espécie mais impopular do subsolo é o Ratus norvergicus, que transmite leptospirose e salmonelose. “Alguns chegam a invadir moradias e a atacar bebês ou crianças, mordendo dedos e arrancando pedaços das orelhas para se alimentar", alerta a técnica do Departamento de Zoonoses Maria da Consolação Cunha. Mas o mais perigoso habitante dos subterrâneos é o escorpião amarelo, cuja picada pode matar. As baratas, mais numerosas, podem invadir residências pelas tubulações.

Água Tratada

Cerca de 2 mil profissionais, entre empregados e terceirizados, operam as redes de água e esgoto. Nas vistorias ao sistema de água, um dispositivo criado em parceria entre Copasa e Universidade Federal de Minas Gerais, chamado lampião, precisa ser baixado por uma corrente. Quando a chama se apaga, é sinal de que não há oxigênio suficiente para se respirar. O interior da caixa de manobra é relativamente limpo, com um emaranhado de canos, conexões, válvulas, medidores, registros e alavancas, encarcerados em cubículo com 1,90 metro de altura e 6 metros de comprimento. Certas válvulas precisam de até oito homens, se revezando em dois turnos, para serem abertas ou fechadas.

Quilômetros de fios e cabos cortam o subsolo

Além dos tubos e galerias, quilômetros de fios e cabos, tanto de eletricidade quanto de fibra ótica, utilizam-se de vias subterrâneas para chegar aos consumidores. No Centro de BH e bairros no interior da Avenida do Contorno, são 390 quilômetros cabos da Cemig enterrados, que atendem 36 mil consumidores, e cerca de 1.200 quilômetros de fibra óptica da Telemar.

O controle da Cemig é feito em câmaras subterrâneas, onde funcionam instrumentos de medição e transformadores com acesso pelos bueiros. São cômodos mais amplos, com projeção voltada para a via pública e de baixa profundidade. Mesmo quando um certo volume de água invade o espaço, seja de chuva ou de acidentes com redes de esgoto clandestinas, não haveria perigo de eletrocussão, de acordo com o engenheiro chefe da Região Central da cidade, Paulo Roberto Rodrigues Mendes.

“O equipamento é completamente vedado. É um aparato que recebe uma grande voltagem (13.800 volts), que chega aos transformadores, onde é reduzida para o padrão de consumo, de 220 e 127 volts. Mesmo que tudo fique submerso, não há perigo de vazamento da força", afirma o engenheiro.

No Centro, a rede elétrica é subterrânea desde 1973. “O custo é maior para a implantação, mas a confiabilidade é maior. Os cabos ficam menos expostos a acidentes externos, galhos de árvores, vandalismo. A manutenção também é mais barata. Com 15 anos de uso, a rede subterrânea paga os custos da aérea", calcula o enge nheiro. Desde a implantação, nunca houve pico de energia por falha do sistema, de acordo com Paulo Roberto. “Já aconteceram problemas em função de fatores externos na geração ou transmissão, mas nunca na rede de subsolo".

Tanto os cabos de fibra ótica quanto os de eletricidade são subterrâneos também por uma questão de engenharia, já que seria difícil que tantas unidades utilizassem os postes. Só na Região Central, o consumo médio é de 700 kw/h, enquanto o residencial é de 250 kw/h

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Repórter do jornal Hoje em Dia, o jornalista Mateus Parreiras cobre o dia a dia do estado no caderno Minas (cidades) e produz também reportagens especiais. Formado em 2004 pelo UNI-BH, e desde setembro daquele ano no Hoje em Dia, o jornalista já conquistou o I Prêmio de Jornalismo de Interesse Público 2007 do Sindicato dos Jornalistas de MG, o Prêmio Crea-MG 2006, Volvo 2006 e foi três vezes finalista do Prêmio Embratel, em 2005, 2006 e 2008.

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